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sexta-feira, 8 de abril de 2011

Síndrome de Prader-Willi

A síndrome de Prader-Labhart-Willi (PWS) é uma síndrome rara, debilitante e associada, na maioria dos casos, a uma deleção parcial do cromossomo 15 derivado do pai ou, em outras palavras, a uma dissomia uniparental do cromossomo 15 materno (15q11-13). Ainda não foram identificados os genes responsáveis pela síndrome.
Trata-se, portanto, de uma situação genética conhecida como "imprint genômico", caso em que o cromossomo duplicado, se de origem paterna, causa uma determinada patologia, enquanto que, se de origem materna, causa uma outra doença. No caso do cromossomo 15, se o cromossomo duplicado for o paterno, advém a síndrome de Angelman; se o duplicado for o materno a síndrome será do Prader-Willi.
Estima-se que a incidência do PWS é 1/25000 nascidos vivos e a característica mais marcante dessa síndrome no período pré-natal é um notável grau de hipotonia que freqüentemente leva à dificuldade de sucção, ameaçando a sobrevida da criança. Já numa idade posterior, paradoxalmente, é um apetite insaciável que passa a ser o grande problema do paciente, levando-o freqüentemente a um excesso de peso (obesidade mórbida) e ao óbito por complicações metabólicas e hipoventilação alveolar.

Aspectos genéticos

Como a PWS decorre da ausência da região PWS/AS no cromossomo 15, o ponto crítico para o diagnóstico é a demonstração de que esta região tem apenas a contribuição materna e uma das maneiras de se documentar tal fato é o teste de metilação do DNA, que detecta mais de 99% dos casos.
Em termos de análises citogenéticas, 70% dos pacientes com PWS tem uma deleção do cromossomo 15 envolvendo as bandas 15q11-q13, que pode ser detectada com estudos cromossômicos de alta resolução e pela técnica de hibridação fluorescente in situ (FISH). Cerca de 1% dos pacientes apresenta um rearranjo cromossômico que resulta numa deleção da região crítica PWS/AS.
A técnica de biologia molecular empregada para detecção do PWS baseia-se na hibridação de Southern utilizando uma sonda sensível à metilação (SNRPN ou PW71B) ou com a técnica do PCR (reação em cadeia da polimerase) utilizando primers específicos para cada um dos pais (sensíveis à metilação). Dessa forma, se a amplificação por PCR for característica de uma herança materna exclusiva, fica confirmado o diagnóstico de PWS.
O teste de metilação do DNA detecta todos os casos de PWS causados por deleções, dissomia uniparental e defeitos de imprinting. A diferenciação entre os vários mecanismos que levam ao PWS é importante para propósitos de aconselhamento genético. Utilizando-se a técnica de FISH com a sonda SNRPN, podemos detectar as deleções. Marcadores microsatélites informativos podem permitir a identificação de dissomia uniparental (2). Nos pacientes em que não se detecta deleção ou dissomia uniparental, um padrão de metilação alterado é evidência de um defeito de imprinting (3).

Critérios diagnósticos

Em 1993, Holm e col. chegaram a um consenso com relação aos critérios diagnósticos, dividindo os achados em "maiores" e "menores" (1). Os critérios maiores valem um ponto cada, enquanto que os critérios menores valem ½ ponto cada. Para crianças com menos de três anos de idade são requeridos cinco pontos para o diagnóstico, quatro dos quais devem ser critérios maiores. Para indivíduos com mais de três anos de idade, oito pontos são requeridos para o diagnóstico, pelo menos cinco dos quais sejam critérios maiores. Os "achados de suporte" apenas aumentam ou diminuem o nível de suspeita diagnóstica.

Critérios maiores

Hipotonia neonatal com sucção pobre, que melhora com a idade.
• Problemas de alimentação e/ou insuficiência de crescimento, com a necessidade de gavagem ou outras técnicas especiais de alimentação.
• Ganho de peso entre um ano e seis anos de idade, causando uma obesidade central.
• Hiperfagia.
• Características faciais - diâmetro bifrontal estreito; fissura palpebral em forma de amêndoa; boca virada para baixo.
• Hipogonadismo: Hipoplasia genital - pequenos lábios menores e pequeno clitóris em mulheres; escroto hipoplásico com criptorquidismo; puberdade incompleta ou atrasada; Infertilidade.
• Incapacidade de aprendizado com certo retardo mental.

.Critérios menores

Diminuição dos movimentos fetais e letargia durante a infância.
• Problemas comportamentais como explosões temperamentais com obsessão compulsiva, teimosia, rigidez, roubo e mentiras.
• Distúrbios de sono, com apnéia.
• Pequena estatura para o alvo familiar.
• Hipopigmentação.
• Mãos e pés pequenos para idade e altura.
• Mãos estreitas com o bordo ulnar reto.
• Miopia.
• Saliva espessa e viscosa.
• Defeitos de articulação da fala.
• Pele pigmentada.

Achados de suporte

Alto limiar para dor.
• Diminuída capacidade para o vômito.
• Escoliose.
• Adrenarca precoce.
• Osteoporose.
• Habilidade incomum para quebra-cabeças.
• Estudos neuromusculares normais (exemplo: biópsias, eletromiografia, velocidade de condução nervosa).

 Apresentação clínica

Na síndrome de Prader-Willi o crescimento insuficiente pode já ser evidente no nascimento, mas em geral, é muito mais evidente no período pós-natal, atingindo-se a altura média de 155cm para homens e 148cm para mulheres. O que, no entanto, chama mais atenção no período neonatal é a extrema hipotonia que essas crianças apresentam e que leva inclusive a dificuldades alimentares relacionada à ineficiente sucção.
Durante o período gestacional esta hipotonia já pode ser observada pela diminuição dos movimentos fetais, pela posição fetal anormal no parto e pelo aumento da incidência de cesárias. Esta hipotonia é considerada um dos critérios maiores para o diagnóstico e, juntamente com os problemas alimentares, respondem por dois dos cinco pontos necessários para o diagnóstico em crianças com menos de três anos de idade. Evolutivamente esta hipotonia melhora e chega a regredir totalmente.
Nos meninos, criptorquidia, hipoplasia escrotal e micropênis podem estar presentes, enquanto que nas meninas podem-se notar lábios menores e clitóris pouco desenvolvidos. Em idade posterior, este quadro de hipogonadismo de origem hipotalâmica manifesta-se por puberdade atrasada (além dos 13 anos na menina e 14 anos no menino) ou incompleta, sendo a infertilidade o resultado final desse processo, porém há a um caso documentado de reprodução numa mulher portadora da síndrome (4).
Com o avançar da idade, a hiperfagia e a obesidade tornam-se predominantes. O apetite é insaciável e há relatos impressionantes da quantidade de alimento que pode ser ingerida por tais crianças. Os pacientes procuram avidamente por comida, chegam a roubar dinheiro para comprá-la - aparentemente não existe o centro da saciedade, o que caracteriza uma anormalidade hipotalâmica.
Como os pacientes com PWS apresentam algum grau de alteração intelectual, que varia de um retardo mental limítrofe (40% dos pacientes) a moderado, fica sempre muito difícil tentar-se conseguir a colaboração voluntária dos pacientes para perder peso. A obesidade acaba sendo o resultado desta ingestão calórica exagerada e da baixa taxa de metabolismo basal, que chega a ser tão intensa que leva a hipoventilação alveolar (síndrome de Pickwick). Vários trabalhos da literatura sugerem que 7 a 20% dos pacientes com PWS apresentam diabetes mellitus cujo início pode ocorrer já na pré-puberdade (5).
As anomalias cognitivas tornam-se muito evidentes quando a criança atinge a idade escolar. A maioria das crianças com PWS apresenta QI entre 60 e 70. São comuns os problemas de comportamento que interferem na qualidade de vida na fase adulta. Em 5 a 10% dos pacientes, um quadro psicótico já é evidente no início da adultícia (6, 7).
Características crânio-faciais, como olhos amendoados, dolicocefalia, boca pequena com os lábios voltados para baixo ou saliva viscosa, podem ou não estar presentes já no recém nascido. Em todos os seis recém-nascidos estudados por Miller e colaboradores essas características estavam ausentes (8).
Hipopigmentação dos cabelos, olhos e pele ocorre em 1/3 dos indivíduos. Estrabismo é visto em 60 a 70 % dos casos e escoliose variável em gravidade e em idade de início é observada em 40 a 80 % dos pacientes. Uma característica curiosa dos pacientes com PWS é o lento crescimento de mãos e pés. Os pés atingem aos dez anos de idade um tamanho de 20cm na menina e 22cm no menino.

Diagnóstico diferencial

Algumas situações clínicas podem cursar com hipotonia e algumas delas são emergenciais como, por exemplo, a sépse neonatal. Depressão do sistema nervoso central, algumas vezes induzidas por drogas, distrofia muscular miotônica congênita e várias miopatias e neuropatias podem levar a hipotonia e podem comprometer a capacidade respiratória, o que é raramente visto nos pacientes com PWS.
Já em idade mais avançada, o retardo mental ou o atraso do desenvolvimento neuro-psico-motor, a obesidade e o hipogonadismo podem levantar a suspeita de síndrome de Laurence-Moon-Bardet-Biedl, neste caso usualmente acompanhado por polidactilia e alteração visual devida a distrodia retiniana. Um subgrupo de pacientes com a síndrome do X frágil apresenta obesidade devida à hiperfagia. Os poucos casos de deleções 6q ou 1p podem mostrar um fenótipo semelhante. Insuficiência hipotalâmica adquirida pode ser distinguida pela história clínica e por exames de imagem. (7).

Opções terapêuticas

No lactente (crianças nos primeiros dois anos de vida), a emergência terapêutica está na manutenção de uma nutrição adequada já que a hipotonia costuma ser tão grave que dificulta a alimentação e coloca em risco a sobrevida da criança.
Técnicas especiais de alimentação incluindo bicos especiais ou mesmo alimentação por gavagem podem ser necessárias. Fisioterapia iniciada precocemente pode melhorar o tônus muscular. A criptorquidia pode se resolver espontaneamente ou pode necessitar de tratamento hormonal (gonadotrofina coriônica humana - hCG) ou cirúrgico (orquiopexia).
No período pré-escolar, o problema da obesidade começa a se manifestar e deve exigir cuidados com relação ao esquema alimentar, recomendando-se não se exceder 1000 a 1200Kcal por dia. Nos últimos anos tem-se tentado a administração de hormônio de crescimento na tentativa de reduzir-se o ganho ponderal dessas crianças, através do seu efeito lipolítico.
Lindgren e Ritzén apresentaram sua experiência de cinco anos de tratamento com hormônio de crescimento em 18 crianças pré-púberes e observaram que no primeiro ano de tratamento houve um aumento importante em altura, que se manteve com a continuidade da terapêutica. O índice de massa corpórea (BMI) no primeiro ano diminuiu significantemente, mas voltou a aumentar num período de seis meses sem tratamento. Com o reinício da terapêutica houve estabilização do BMI.
Duas das crianças desenvolveram diabetes mellitus num período em que houve rápido ganho de peso, mas a homeostasia glicêmica voltou ao normal quando o tratamento foi suspenso. Os autores concluem que houve um efeito favorável do GH sobre a composição corpórea de pacientes com PWS e que o tratamento deve ser individualizado com estreita supervisão da homeostase glicêmica (11).
Tem sido a opinião de vários autores que os pacientes portadores de PWS apresentam disfunção hipotalâmica que levam à deficiência de hormônio de crescimento (12 e 13). Os testes funcionais para avaliação da deficiência de GH têm esbarrado em alguns problemas e sabe-se que crianças obesas não apresentam resposta de GH aos diversos estímulos farmacológicos empregados (clonidina, insulina, arginina, entre outros).
Parece que a elevação dos níveis insulinêmicos que ocorrem nestes pacientes reduzam os níveis da proteína transportadora de IGF-1 (IGFBP-1) de modo que os níveis de IGF livres se elevam e inibem a produção de GH. Desta forma, ficamos em dúvida se essas crianças são realmente portadoras de deficiência de GH, mas a experiência clínica que temos tido com o tratamento de crianças com PWS é concorde com outros autores quanto ao efeito benéfico do GH na composição corpórea desses pacientes.
Entre 9 e 20% dos pacientes com PWS apresentam diabetes mellitus (DM). Apenas três casos de DM foram documentados antes dos dez anos de idade, o mais jovem com 26 meses. Os três casos necessitaram de terapêutica insulínica e o tratamento usualmente segue os modelos convencionais. Em algumas situações, podemos ter um DM tipo 2, usualmente sem ceto-acidose e com anticorpos anti-ilhota e anti-insulina negativos, necessitando de medidas dietéticas e de agentes hipoglicemiantes orais (5).
Apesar de o hipogenitalismo constituir-se num sintoma chave para o diagnóstico de PWS (critério maior), adrenarca prematura é freqüentemente observada nesses pacientes e é considerada um sinal menor. Poucos casos de puberdade precoce central (puberdade precoce verdadeira) têm sido descritos (14) e o tratamento, dependendo da idade do diagnóstico, inclui o uso de análogos do GnRH (análogo do fator liberador de gonadotrofinas hipotalâmico). A detecção desses casos chama a atenção para a responsividade normal de alguns pacientes com PWS, mostrando que a insuficiência gonadal usualmente presente é de origem hipotalâmica.



REFERÊNCIA BIBLIOGRAFICA:



POSTADO POR: DEBRIELE SILVA DOS SANTOS




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